domingo, 28 de agosto de 2011

Carregar a cruz não significa resignar-se

Depois de Pedro ter reconhecido em Jesus o Cristo, provocou-se uma relação especial entre Jesus e ele, pois Jesus – por Sua vez – reconheceu e ratificou o primado de Pedro. No Evangelho de hoje vemos que para Pedro a relação – entre ele e Jesus – é ambígua. Desta forma, Pedro dá um ‘vacilo’ que foi bem aproveitado pelo demônio.

Jesus, porém, tenta contrapor à possibilidade de um profundo mal-entendido a verdade quanto à Sua missão. Era um esforço, para que ninguém, dentre os discípulos – e dentre nós – se iludisse com falsos triunfalismos. É preciso ter consciência de que o seguimento a Jesus não conduz a sucessos aplaudidos pela multidão, mas sim passa pela cruz, pelo sofrimento, pela Paixão, morte e ressurreição.

Na mente de Pedro a questão era simples: se Jesus é o Cristo, se as Escrituras apresentam a vitória final e definitiva de Deus sobre o mal e os inimigos dos homens de bem, consequentemente, Jesus terá sucesso. E, por isso, Pedro repreende a Jesus: “Que Deus não permita! Isso nunca vai acontecer com o Senhor!”

A resposta de Jesus não tardou a vir, recordando a Pedro qual é a lógica de Deus: “Longe de mim, Satanás!” Jesus mostra a Pedro quanto sua atitude estava perto da de Satanás, que atrai os homens com milagres e portentos, com sucesso e aprovação. Jesus mesmo fez experiência da sutil maldade do adversário e daquelas artimanhas que atraem o homem com a ilusão de resultados eficientes a curto prazo. Continuar por aquele caminho conduziria, com certeza, Pedro a se associar ao adversário.

As Sagradas Escrituras, inúmeras vezes, nos apresentam a fonte do pecado como ligada à decisão de um homem no momento em que escolhe prescindindo de Deus sem sequer ‘perguntar’ ou ‘ouvir’. Talvez, mais que a associação com Satanás, a Pedro tenha doído muito mais a expressão que encontramos no versículo seguinte: “Tu és para mim escândalo”;» trata-se de um hábil jogo de palavras de Jesus que recordava a Pedro – e a todo discípulo – que o novo nome que ele tinha recebido, ‘pedra’ (que era o atributo dado ao próprio Javé, a ‘rocha’ de Israel), poderia significar tanto uma pedra para construir quanto uma pedra que dificulta o caminho. Tudo depende da atitude que alguém toma quando caminha com Jesus. Então, à firme advertência a Pedro, Jesus acrescentava também um conselho, uma indicação para o caminho correto. A palavra ‘afasta-te’, significa algo mais importante: indica o gesto de quem se ‘deixa conduzir’, que fica atrás. Também tem o sentido de ‘prender-se ao jugo’.

Esta figura, a do boi que se deixa prender ao jugo, era querida por Jesus: “Tomai sobre vós o meu jugo e aprendei de mim, que sou manso e humilde” (Mt 11,29). É uma imagem emblemática, pois responde àquela presunção de saber ‘como e quando’ com a escolha de perder a própria autonomia, a independência como um boi ao lado de um outro. Significa escolher não antecipar o tempo e o caminho que Deus deseja que percorramos, mas percorrê-lo passo a passo com o tempo do outro.

Ter a certeza da vitória definitiva do amor sobre o egoísmo, do bem sobre o mal, não exime a ninguém de percorrer o mesmo caminho de Jesus, pois é o próprio caminho que gera a comunhão com Ele, não o resultado.

Quem tentou colocar emparelhados dois animais sabe muito bem que isto é dificílimo inicialmente, a não ser que os dois ‘aprendam’ a estar juntos, passo a passo, lentamente, obstáculo após obstáculo. Mas sempre unidos tanto quanto um boi está preso a outro. Nisto está a força que uma junta de boi produz, maior que a soma de cada um. Presunção ou humildade, confiança ou protesto, isto faz a diferença entre um discípulo de Cristo e um“inimigo da cruz de Cristo” (Fil 3,18), atributo que Paulo dispensa àqueles que desejam resultados. Assim, o jugo se transforma também em ‘cruz’ para Jesus, carregar o jugo é carregar a cruz.

Longe de toda visão piedosista ou melodramática com a qual ligamos um sentimento passivo e negativo à cruz, é preciso lembrar que, para Jesus, a cruz tinha um outro significado.

O cristão não é um “resignado” que deve “carregar” um peso como um destino que Deus faz recair sobre ele. Este não é o nosso Jesus! A cruz foi para Ele mais do que um símbolo de sofrimento, foi o símbolo do amor até o sofrimento.

Deste modo, as palavras de Jesus poderiam ressoar assim: assumam sobre vós aquilo que Eu assumi como sentido da minha vida, até o fim amem. Aqui está a vida! O medo de perder, fará perder de fato a vida.

Vida é proximidade com Deus, com Jesus, para aquilo que der e vier.

Padre Bantu Mendonça

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