quarta-feira, 4 de agosto de 2010

O amor do padre é da Igreja

Na carta aos Efésios, São Paulo nos apresenta o exemplo maior do amor: Maridos, amai vossas mulheres, assim como Cristo amou a Igreja e se entregou por ela.

Tempos atrás eu vi na estante de um padre um livro com este título: Os padres também amam. Pensei que era um livro de espiritualidade para padres, mas era um livro sobre escândalos na vida de padres.

Na realidade, o padre não é padre para amar menos, mas para amar mais. Aquele apelo de Paulo pode significar também o seguinte: Padres, amem a Igreja, assim como o marido ama sua mulher e seus filhos e dedica sua vida à sua família. Ninguém tem maior amor do que aquele que dá sua vida por seus amigos.

Foi assim que Jesus falou, e foi assim que ele fez. Entregou sua vida para abrir para nós o caminho da salvação. Não foi apenas na hora da cruz que deu sua vida por nós. Toda sua vida na terra foi dedicada à nossa salvação. Desde o seu nascimento na pobreza de uma família que não encontrou hospedagem e logo precisou enfrentar uma longa viagem pelo deserto para fugir da perseguição dos poderosos.

Começou seus três anos de pregação com quarenta dias de jejum no deserto. Deixou-se expulsar de Nazaré por conterrâneos que não aceitavam sua pregação. Enfrentou com paciência calúnias e críticas dos fariseus, dos escribas e doutores da lei, dos exegetas e teólogos daquele tempo que deviam ser os primeiros a reconhecer nele o Messias anunciado pelos profetas. Suportou as dificuldades de uma vida itinerante, às vezes dormindo ao relento. Dos discípulos exigia os mesmos sacrifícios.
O celibato, deixar de ter esposa e filhos por causa do Reino de Deus, só faz sentido no contexto de uma vida dedicada à missão confiada ao padre por Jesus na Igreja para o mundo. Muitos dirão que a Igreja e o povo exigem demais dos padres, e que nem todos conseguem viver a vida toda inteiramente dedicada ao povo de Deus.

Os padres são feitos do mesmo material que os outros. Alguns começam cheios de entusiasmo e depois esmorecem. Como namorados apaixonados que no início do convívio capricham para agradar e mais tarde passam a ceder às tentações da traição. Outros continuam fiéis, mas não vivem mais na felicidade de uma vida de amor. Passam a cuidar de si mesmos em vez de cuidar da sua família.

A família do padre são os paroquianos. Já nos primeiros séculos da Igreja surgiu também a vocação para a vida religiosa em conventos de monges ou monjas, de frades ou freiras, com os votos de pobreza, castidade e obediência. Os padres diocesanos não fazem voto de pobreza, mas assumem o compromisso de uma dedicação integral no celibato e fazem a promessa de obediência ao bispo. Precisam ser um exemplo de obediência às leis da Igreja que pregam aos outros.

Diante de fraquezas visíveis ou escondidas, reais ou imaginárias, e diante da falta de padres, muitos acham que a Igreja devia permitir que os padres casassem, ou admitir a ordenação de homens casados. Acontece que ser padre não é uma profissão, não é carreira que se escolhe de acordo com as próprias preferências ou pelo critério de uma remuneração melhor. O peso do celibato obrigatório serve para medir a fé e a disposição do candidato ao serviço sacerdotal.

Quando um padre tinha mais prestígio na sociedade ser padre podia parecer coisa atraente para jovens do interior, que depois recuavam diante da exigência do celibato. Tal exigência não pode ser separada do contexto maior de uma vida dedicada a Deus, à Igreja, ao povo. Não faz sentido renunciar ao convívio de esposa e filhos e depois apegar-se a coisas menores. O discípulo de Jesus não pode fugir da sua cruz.

Para o serviço de sacerdote na Igreja de Jesus só serve quem estiver com a disposição de colocar-se a serviço do povo de Deus para o que der e vier, incluindo a obediência à Igreja com aceitação das suas exigências, mesmo sem entender as razões quando razões pessoais parecem ter um peso maior.

Quando eu estava procurando meu caminho no ambiente turbulento da Escola Técnica Federal da Suiça, um colega muçulmano questionava minha vocação: “Como é que você pode pensar em ser padre? Como é que pode saber que não vai embarcar numa canoa furada? Como é que pode ter certeza que Jesus é algo mais que outros profetas? Como é que pode saber que a verdade se encontra na Igreja Católica? Não é melhor cuidar da sua vida, ter uma boa carreira na ciência? No serviço militar, um comandante me disse quase a mesma coisa.

Ser padre só faz sentido numa perspectiva de fé. Aí está o problema maior do nosso tempo de confusão de idéias e valores: A falta de firmeza na fé, até em países onde quase todos ainda se dizem cristãos e onde todo dia se abrem novas igrejas disputando adeptos em torno de pregadores de auditório que vendem milagres.

Nos ambientes intelectuais se difunde um ateísmo que nega a existência de Deus, preparado por um agnosticismo que diz que ninguém pode encontrar a verdade, que ninguém pode ter certeza de nada. A única certeza que admitem é esta: que nada é certo. Será que no íntimo do seu niilismo eles têm certeza disso?

A missão do padre é apresentar a Palavra de Deus a todas as pessoas de boa vontade, fazer como Jesus que passou pela vida fazendo o bem pela sua pregação. Prega a Palavra, quer agrade quer desagrade. Quem ama, faz o que pode para não desagradar, e para agradar, com palavras e atitudes. (1 Cor 13,4-8) O padre precisa cativar os jovens que são o futuro mas procuram o futuro longe da Igreja. Atrair para instruir. Não para aumentar o número de adeptos, mas para que todos tenham vida e possam perceber que Deus veio estar conosco para que possamos estar com Ele.

Ezequiel criticava os pastores que se apascentam a si mesmos. O padre não é padre para si mesmo. Ser padre é ser para os outros.


Dom Cristiano Jakob Krapf

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